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quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

EU NÃO SOU CACHORRO NÃO - SIMBA IS NOT A DOG NO!

A iniciativa de trazer outro gato pro Simba conhecer não foi a primeira ideia de jerico que tivemos com relação ao nosso filhote felídeo. Logo que o adotamos entramos numa de que deveria ser legal o levar para passear de vez em quando. - Pô, nada a ver o gato ficar trancado o tempo todo dentro de casa. - Fomos ao Petshop procurar uma coleira style para gato e descobrimos que isso ­- meio que, tipo assim - não existia ou estava em falta permanente. Os donos da loja nos olhavam incrédulos e divertidos, porque ninguém passeia com gatos, depois de adaptados os bichanos não gostam de sair de seu território.
 
Veja a "animação" do Simba brincando no escorregador 
A pessoa do Petshop – que não era mão boba nem nada – estava ali pra vender, então achou uma coleira de pequinês ou pinscher e disse que provavelmente se adaptaria ao tamanho do bichando, o que de fato aconteceu. Depois - enquanto passava o cartão e embalava a parada - comentou, mas muito assim, como quem não quer nada:

- É débito, né? Então... Vocês só têm que ter cuidado se aparecer algum cachorro... - Pois eu não tinha pensado nessa possibilidade... Só de ouvir os inúmeros latidos da cachorrada de nossa vizinhança o Simba entrou em pânico. Sinceramente, nunca tinha me dado conta de que havia tantos cachorros em tudo quanto é lugar. Realmente um mundo cão, cujo (cujo?) cardápio - na paranoia do Simba - seria "definitivamente" felino. Resumindo: o passeio, foi uma experiência única, inclusive no sentido de que não se repetiu até agora.

A vida moderna dos humanos é uma correria louca, especialmente quando vai chegando o final do ano. Parece que surge um funil, um moedor de carne, que vai estreitando, vai apertando, empurrando para dentro e para fora até que saímos em janeiro, moídos que nem boi ralado. Foi nesse meio tempo que apareceu a Letícia pedindo para interceder na adoção de um gato. Quando será que foi isso? Setembro, talvez outubro. De novembro em diante não foi que aí a gente já estava dentro do funil.

Como dito no post passado, eu me encantei com as fotos de um casal de gatinhos no Facebook e compartilhei na minha página. Tudo parte da empolgação com o Simba, para mim todo mundo deveria adotar um bichinho também. Nessa onda me comprometi a levar o filhote para a filha de meu primo Everaldo. Vem daqui e vai pra lá, combinamos de pegar o gato em Vila Velha, no sábado depois do almoço. Daí – planejamos – o bicho ficaria lá em casa “brincando” com o Simba até a manhã do domingão, quando, bem cedinho, pegaríamos a estrada e seguiríamos ao seu destino final, sua nova família em Fundão.
 
Zeus em um raro momento de tranquilidade na casa do Simba
O gatinho era pequeno e branquinho, devia ter uns três meses. Como é comum acontecer nos foi contada sua saga enquanto Alice acomodava o bichinho dentro de um desses negócios para transportar gatos. Partimos, e dali para frente o bicho miou, miou e miou. Miou toda a terceira ponte, miou para o pedágio, miou até para o semáforo. Miou com o carro andando, miou com ele parado, miou dentro do elevador, miou, miou desesperado. Só parou quando entramos em casa e, ainda na cozinha, o apresentamos ao Simba.

A antipatia felina foi mútua, visceral e imediata!

Só agora me dou conta de como é difícil descrever aquele negócio que o gato faz quando quer assustar outro bicho. Mostrando os dentes e fazendo gatice a la American Vampire. Hissszzz! Todo mundo já deve ter visto um gato no auge da puteza, o problema é que a gente não imaginava que o Simba ficaria tanto! Se deixasse o barco correr solto ele teria destroçado o branquinho! Bom, talvez não, porque também não imaginávamos o virulento instinto de sobrevivência do pequeno filhote.
 
Corre para as colinas abestado!
Durante todo o dia que ficou lá em casa o “branquinho” mostrou-se um antissocial apavorado, ao tentar o acalmar tomei uma unhada desesperada na perna, daquelas de arrancar sangue. Lembrei a velha máxima de Chico Anísio: “uma das sete maravilhas do mundo é o gato que nasce com unhas e dentes e não arranha o cú da mãe”. O jeito foi trancar o novato na sala e tentar acalmar o Simba que perambulava indócil pelo resto da casa. Isso quando tivemos tempo, porque rolou um ensaio de três horas do Algazarra Arte Coral e outros compromissos.
 
Encontro de Zeus com sua nova família
Assim como Simba se identificou comigo - diz um amigo que ele me escolheu para dono - o mesmo o branquinho fez com Alice, com quem Simba ficou depois mais de uma semana sem falar direito. No dia seguinte ela conseguiu fazer o bichano apavorado comer um pouco de ração. Comecei a ficar preocupado com a adaptação do bicho na casa de meu primo, com duas crianças, mas confiamos na sorte e fomos a Fundão completar a missão. O gato foi acolhido em festa, teve até um almoço de recepção. Letícia e Matheus ficaram encantados e o batizaram de “Zeus” que, para minha surpresa, longe de outras ameaças felinas, virou Rei lá no pedaço.
 
Zeus e sua patroa, "mais que um leão feliz"*
De volta para casa encontramos o Simba sentindo-se traído e mal pago, nem um pouco a fim de papo, nos olhava rosnando grosso como quem matuta uma vingança. Dias depois o bicho ainda estava revoltado e danou a mijar meus tênis e sapatos, fazendo a chamada demarcação territorial. Perguntei intrigado aos conhecedores do assunto: mas por que ele “demarcou” só os meus sapatos? Uns disseram que por causa de eu ser o macho (alfa) da casa, outros porque ele me escolheu para dono. 

Para mim o Simba quis mandar uma mensagem, de maneira que quando algum outro gato aparecesse ficasse logo sabendo: Escuta aqui mermão! Tu trata de ralar o peito porque quem manda aqui no pedaço não é esse humano grandão aí não, tá sabendo? Aqui quem manda sou eu! 


Miau, miôu e tenho dito!
P.S. * Sempre tive dificuldade de entender as letras da banda Paralamas do Sucesso. A frase entre aspas na legenda da foto de Letícia e Zeus, vem da canção "Vital e Sua Moto" e na verdade é: "mas que união feliz"...

sábado, 23 de janeiro de 2016

NOVAS AVENTURAS DO SIMBA

Em um texto anterior sobre o bichano mais fotogênico do universo afirmei que o nosso gato, o Simba, tem hábitos noturnos; passado seis meses descobri que não é bem assim que a parada funciona. A verdade é que esse sujeito que não ultrapassa a altura das minhas canelas leva a vida num ritmo diferente dos humanos: tira longas sonecas - seja de noite ou de dia - e depois brinca de pique esconde (seu predileto), come e bebe água, faz a toalete ou fica virado no modo “guardião”.

Simba sonhando com a liberdade
Para conseguir tirar suas grandes sonecas durante o dia o Simba se esconde no que entende como “modo invisível”. Seu lugar preferido para desaparecer é dentro do sofá da sala, mas costumamos encontra-lo debaixo de nossa cama, enfiado dentro do armário ou em algum outro cantinho escuro e quente. Numa dessas desaparecidas ficou preso por horas numa das bandas do armário sem que notássemos seu sumiço e, ao invés de miar desesperado, o bicho dormiu a perder de vista.

Além dos modos já comentados o Simba tem o chamado “modo evasivo”. Todo e qualquer barulho – o interfone, a campainha, o liquidificador - é motivo para sair correndo rente ao chão, como soldados nos filmes de guerra, rastejando para fugir de balas perdidas, com o rabo em antena e as orelhas apontadas para trás. Esse gatilho do pânico torna o modo guardião uma coisa curiosa, afinal, o bicho está sempre pronto para empreender a fuga e não para nos defender de um eventual inimigo.

Falei também de minha surpresa quando descobri que o gato se comunica, depois constatei que seu poder de articulação é ainda mais amplo do que eu poderia supor. A princípio notei que quando estava com fome o Simba nos seguia até a cozinha e miava na direção do saco de ração. Hoje quando a fome aperta o bicho vai até onde estamos e dana a chamar atenção, quando paramos o que estamos fazendo ele dá uma espécie de pinote animado em direção à comida. Só falta gritar: hora do rangooo!

Como vive num universo diferente dos humanos o nosso sono é uma parada que incomoda o Simba, não dá nem pra pensar em deixa-lo passar a noite dentro do quarto. No início ele até ensaia uma dormidinha, mas quando dá a doida começa a pular em cima da gente, “brincar de morder” ou lamber com sua língua de lixa. Numa dessas acordei com ele em cima da cabeceira da cama dando lambidas na minha mão e sorrindo para mim. Contei pra Alice que teve um siricotico de tanto que riu.



Apesar de ter o corpo recoberto por um sedoso casaco de pele branco rajado de cinza e marrom, nosso gato é friorento como um baiano, não suporta ficar no ar-condicionado e quando é posto para correr ainda sai resmungando. Por falar nisso, essa semana fomos surpreendidos por um baita discurso matinal. Saímos juntos do quarto e o Simba parecia querer contar alguma coisa muito emocionante que acontecera durante a noite: miau, miou, miau, miau! Depois danou a ronronar alto como um asmático e se arrastar nas nossas canelas, gestos mais comuns do repertório felídio que significa: “Me dá carinho gente! Eu amo vocês!”

O Simba é, portanto, carinhoso do seu jeito independente de ser, é também ciumento e territorialista ao extremo. Tem ciúme, por exemplo, do computador e especialmente do piano onde eu e Alice passamos várias horas sem lhe dar atenção. De vez em quando estamos totalmente absortos e o bicho vem morder o calcanhar, quando paramos o sem vergonha dana a virar pra lá e pra cá fazendo gatice. Tenho, inclusive, a impressão de que seu gosto musical está mais para o clássico do que para o romântico.

Talvez por falta de apreço à música de Chopin o Simba não seja muito chegado em agarração e outras demonstrações de afeto. Também não responde a psiu-psiu, isca-isca e vem cá bichano, seu negócio é ficar de longe dormindo ou montando guarda. Porém, com o tempo e a convivência achei uma forma de invocar sua presença. Não me pergunte como descobri isso, nem sempre dá certo, mas basta assoviar o Tema da Vitória do Ayrton Senna que o gato vem, muitas vezes resmungando contrariado.

Apesar de aparentar ser um heterossexual convicto descobrimos que o Simba tem mais ciúme de mim do que da Alice e também mais do que a própria. Certas noites, quando chego em casa do trabalho, o gato vem se esgueirando e entra numas de me inspecionar. Cheira longamente minhas mãos, meus sapatos e minha mochila e se alguma coisa não soa bem ao seu olfato dana a rosnar e até ameaça morder, mas essa rotina maluca só foi adotada depois que intermediamos a adoção do Zeus.  



Um dia descobri pelo Facebook que havia um casal de branquíssimos filhotes de gato para adoção. Compartilhei a postagem e pelo Wattsapp recebi um recado da Letícia: “Tio Juca, traz esse gatinho para mim aqui em Fundão?” Muito fofa e querida, a filha caçula de meu primo Everaldo, não havia a menor chance de negar seu pedido, mas a operação demandava logística e isso incluía um pernoite do Zeus em nossa casa, ou melhor dizendo, na casa do Simba!

Honestamente, em minha ingenuidade pensei que o gato fosse se amarrar na visita. 


No Próximo post: GUERRA TERRITORIAL!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

PEDALADAS INCONSCIENTES

Estava copiando alguns planos da agenda do ano passado para a atual e vi quantas ideias boas foram deixadas para trás. Projetos que vinham andando tiveram que ser colocados em stand by, porque sou um só e minha desorganização está intimamente ligada à capacidade criativa. Ainda assim, tentei reservar horas do dia para iniciativas encostadas: duas horas para escrever isso, outras duas para desenvolver aquilo e, se sobrar, um tempinho para estudar piano. Na contramão disso, uma das prioridades era voltar a ter contato físico comigo mesmo, deixar um pouco de lado o cabeção.


Uma das anotações mais antigas, por volta de fevereiro ou março, era a ideia de comprar uma Caloi KS. Isso me faz perceber que levei quase um ano para decidir voltar a pedalar. Na verdade, desde que Luciano Rezende venceu a eleição para prefeito - falando das bicicletas como alternativa de transporte urbano - que a ideia me perseguia. Depois até acabei apresentando o lançamento da ciclofaixa e todos os domingos e feriados passei a ver um monte de gente pedalando pra lá e para cá, famílias inteiras e eu só da janela a ver a banda passar.

Não me pergunte quando foi a última vez que andei de bicicleta com regularidade, faz muito tempo de circunferência abdominal. Sei que lá pelos vinte e poucos anos eu parti para a “carreira solo” da vida e nunca mais tive uma. Mergulhei na época das sucatas e dos abismos: paixões e angústias; tesão e tensão; inocência e desilusão. Com o tempo isso esfria, regenera, mas as cicatrizes são pontes resultantes desse atravessar. O quente passa, o frio passa, mas e a sensação de gato escaldado? 

Passei 2015 sabotando a onda de comprar a bicicleta: um dia eu não gostava do atendimento, no outro eu achava o preço caro em comparação com a internet, em outro eu gostava de tudo e na hora de decidir vinha o vendedor dizer que não tinha como encher o pneu. É verdade! Fiquei quase um ano empurrando a ideia com a barriga. Veio então o meu sonoro aniversário de 50 anos e dias depois o natal, então Alice me intimou a acabar com a novela, afinal queria me presentear.

Que surpresa curiosa é constatar na prática o conhecido ditado sobre andar de bicicleta, que o diga aquela parte estratégica que negocia o peso do corpo com o selim! Fato glúteo do “forévis” que, aliás, desmente aquela velha musiquinha idiota dos trapalhões. Senhores, confesso que pedalei. Foram pedaladas sentimentais, muito diferentes daquelas dadas por nossa presidente, um reencontro muscular com a memória de um rapazinho esquecido.

A cidade é hoje muito diferente, pedalar por aí foi mais fácil do que eu pensava e também mais seguro. Toda calçada tem uma rampinha, muitos motoristas dão preferência quando você está na sua razão e o número de ciclistas é muito maior. Falando nisso, a “camicleta” veio até com um negocinho que faz “tlim!” O que não mudou foi o vento. Pegar o nosso nordestão furioso pela testa não é brincadeira.   

Ao dobrar uma esquina o ventão soprou meu boné das Indústrias Stark, adquirido numa loja Geek de São Paulo junto com uma camiseta do Capitão América, quase me esborracho ao reagir institivamente com uma manobra enferrujada. Logo estou traçando rotas e trocando marchas. Ouvindo aleatoriamente Prokofiev, Simon and Garfunkel ou o novo disco de Keith Richards. Lembrando o celular, baixei um diabo de um aplicativo para medir as distâncias e o tempo e nunca lembro de usar.

O meu tempo é hoje! E o lema da família é “a gente capota, mas não freia!”

Sim, defeitos podem ser qualidades e vice-versa. Melhor chama-los de características. Se o amanhã te incomoda e eu não, qual é o problema? Tem duplo sentido, triplo talvez, mas saiba que ninguém é tão bom quanto pensa. Lembra do Renato? Ele dizia “o seu medo de ter medo não faz da minha força confusão”. É... Eu também não sei o que isso quer dizer, mas faz um sentido danado.

Passo pela grande pedra embaixo da ponte e o sol começa a desabar; passo pelo muro dos amores abandonados e descubro que alguém pichou uma advertência: “abra a sua cabeça, seu cérebro não vai cair”. Desemboco na Praça do Papa e descubro uma enorme bolota de metal. Dou uma volta em volta da esfera, dou uma volta no tempo, as rodas giram e minha cabeça roda...

P.S. O final é referência a uma música da banda Pó de Anjo que fez relativo sucesso na Vitorinha dos anos 1980, época em que eu pedalava e não sabia.

sábado, 2 de janeiro de 2016

NÃO PERCA A OPORTUNIDADE!

Pode ler tranquilo que este texto não contém estraga prazeres (spoilers)

Fui assistir ao sétimo Guerra nas Estrelas, o subtitulado “Despertar da Força”. É bem difícil ignorar esse “campeão de bilheterias” – eu não consigo - um pouco por causa do marketing avassalador, outro tanto porque é uma boa série mesmo e seu sucesso estrondoso ficou marcado com sabre de luz no imaginário de minha geração.

Foi no saudoso – pero no mucho – Cine Paz onde travei conhecimento com essa saga estelar, seus heróis e vilões, o lado negro da força e a implícita brancura saxônica do bem, anterior à moda, portanto, equivocada em tempos politicamente corretos. A trilha sonora espetacular, os colecionáveis coadjuvantes robóticos, o peludo Shewbacca e seus uivos dolorosos e engraçados.

Chegam os anos da adolescência madura e a trilogia deságua na televisão aberta, agora rola a onda de ignorar porque é coisa do tempo de infância; mas vem um domingo de tarde, o Guerra nas Estrelas está sendo repetido pela milésima vez e a força te captura de novo: caraca, que legal! A vontade de ter um sabre de luz é grande, mas agora a moda são as espadas ninja.


Na virada do milênio o George Lucas resolve contar o início da saga e bate a desconfiança: “évem esse gringo de novo atrás do meu dinheiro”, mas é impossível escapar ao misto de convívio social e campanha publicitária. Enquanto isso, algumas lojas “geek” vendem réplicas bacanas do Millennium Falcon e do R2D2 que custam tão caro que o mais justo e viável é guardar apenas a lembrança.
                                                                                                                  
Virado no modo cinéfilo experiente, certos momentos da nova trilogia precedente decepcionam o adulto em que me tornei. São inúmeros os clichês desgastados e as expressões de lobo mau do Anakin Skaywalker (Hayden Christensen) – muito criticadas até hoje - acusam um ator mal escolhido; mas muitas outras coisas além dos penteados da senadora Padmé (Natalie Portman) são legais. Nessa altura da vida Guerra nas Estrelas faz parte da família, com seus defeitos e qualidades.


NOVAMENTE UMA NOVA ESPERANÇA

Quase quarenta anos depois é anunciada mais uma leva da velha saga estelar. Com um bocado de gente comentando comecei a me preparar para a ida ao cinema, aproveitei o feriado de Natal e revi os seis episódios anteriores. A oferta abundante de filmes em casa me deixa preguiçoso, porém, a aventura dentro dos conformes cinéfilos proporciona contato com o público que é sempre divertido, mesmo quando aborrecido.

Na fila do MacDonalds – prefiro sanduba e fritas que pipoca – bem na minha frente há duas mocinhas com o pai, um cara mais ou menos de minha idade. Distraído vejo mensagens no WhatsApp e Facebook, penso em fazer uma selfie e postar, mas a ideia soa boboca. Nem vi quando o pai das meninas se afastou e lá pelas tantas, naquele burburinho infernal, entreouvi a que parecia mais velha - regulavam pelos quinze anos - confidenciar:

-  ... E quando eu resolvi deixar ele não fez nada.

O pai voltou, as garotas mudaram de assunto, nada mais ouvi nem me foi permitido assuntar. Fosse eu Carlinhos de Oliveira teceria uma teia enorme de comentários a partir da maneira como as meninas movimentavam inconscientemente os braços e as pernas. Contidas entre a infância e a puberdade,      entre a proteção e a liberdade, entre o tédio comportado e o desejo do prazer.

Na livraria encontro uma edição capa dura enorme da obra From Hell do Alan Moore, penso até em comprar, mas custava uma baba e a história de Jack o Estripador não me interessa tanto assim. Aparece Caê Guimarães, que agora deve estar como eu escrevinhando sua experiência intergaláctica, trocamos ideia e desejamos sorrindo que nem crianças e crianços: “a força esteja conosco”. 

Somente no cinema tive certeza de que aquele é o lugar certo para assistir esse tipo de filme, porque é como ver um jogo no estádio. A plateia era formada por muitos fãns antigos, uma torcida fervorosa que fez da exibição uma espécie de conferência Jedi. As expressões de deleite e surpresa, os aplausos no auge dramático amplificaram a minha fruição da trama, transformaram uma simples ida ao cinema num momento mágico, como fora no passado e para o qual é sempre bom retornar.

Então não me pergunte se o filme é bom, se eu gostei ou se é mais do mesmo. Aliás, não me pergunte por que certas coisas são indispensáveis nessa vida complicada da gente. Vá lá e descubra, não quero estragar a surpresa de nenhum padawan à procura de um mestre Jedi que lhe desperte força suficiente para sair do conforto de sua galáxia distante. Considere o desejo frustrado daquela bela menina moça e seu namoradinho que conheceu na pele a velha máxima de Rabelais:

“A oportunidade é um cavalo sem rabo”.