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terça-feira, 30 de março de 2010

ELES QUEREM VER O CÍRCULO PEGAR FOGO!


Nas minhas aulas na UFES tenho instigado os alunos a escrever, faço de conta que estou enrolando, conto piadas e no final saco da cartola alguns argumentos escrivinhatórios capazes de fazer até GPS perder o rumo de casa. Mas a rapaziada também me surpreende e socializa informação, trazem comentários inteligentes sobre coisas que escrevi e até sugerem filmes que não vi. Uma destas veio da Danúbia e se chama O Closet (Le Placard). Comédia francesa abordando de maneira muito divertida o preconceito homossexual.


Daí que hoje de manhã vi logo uma twittada sobre o Rick Martin ter assumido a homossexualidade publicamente, no final a moça falava assim: “quando o Dourado assumir me acordem”. Ontem à noite durante a exibição do Big Brother a Globo teve que veicular um anúncio, ou algo assim, do Ministério da Saúde explicando por A + B como se pega AIDS. Tudo por conta das tiradas homofóbicas daquele “bad boy dos pampas” que se tornou o preferido do público e que, por essas e outras, deve sair campeão do programa.


Alguns cronistas já vinham chamando atenção para o comportamento preconceituoso do povão brasileiro, destacando inúmeras comunidades criadas para celebrar a grosseria e as tiradas machistas do “hômi com agá” do BBB10. Tom Jobim já dizia que “O Brasil não é para principiantes” e algum conterrâneo completou dizendo que “O Espírito Santo é o Brasil do Brasil”. O público escolheu a versão caricata do macho, mesmo que politicamente incorreto. Poderiam muito bem ter optado pelo dócil Michel ou mesmo o Kadu, mas Dourado jogou com o personagem da moralidade grosseira e se deu bem.


Se dependesse dos roteiristas Franceses – não sei se lá tem BBB e nem se a mesma discussão já aconteceu para testar o público – um mané como Dourado não teria durado nem um fim de semana. No filme “O Closet” vemos um contador, por todos classificado como um tremendo chato, que vê sua vida se transformar para melhor depois que inventa ser gay para não ser demitido. Separado da esposa, desprezado pelo filho, a principal personagem vê tudo mudar para melhor e a vida se resolver como num passe de mágica. É um conto de fadas que debate o preconceito homossexual pelo viés do humor e não do sofrimento, é preciso ter uma comunidade muito madura para encarar as coisas com tanta felicidade.


E é desse humor que falava sobre o Brasileiro, capaz de rir de tantas coisas ruins –lembra das piadas sobre a morte do Senna? – não deu conta de aceitar a exuberância dos gays como uma coisa normal e julgar a partir do caráter das pessoas que agem dentro de uma certa lógica e outras que são equivocadas, preferindo bater na tecla do falso moralismo e do preconceito. Ponto para o Dourado que espertamente capitalizou essa “temndêeencia”, mas a sociedade ficou devendo. E nem adianta vir dizer que o BBB é programa de gente alienada não, porque conheço inúmeros intelectuais que o assistem, adotando ou não os velhos discursos antropológicos de estudo do fenômeno.


A única chance que os gays da casa teriam seria jogar com outros preconceitos do imaginário social, como o uso de drogas, a falta de religiosidade ou coisas assim. Clodovil teria logo taxado Dourado de maconheiro pra baixo, vagabundo tatuado filho de satã, rapidinho teria a audiência a seu favor. Moralismo se combate com moralismo, esperar que o público fosse o censurar por ser preconceituoso... Tsc, tsc, tsc! Santa ingenuidade, hein? Bunita!


sábado, 27 de março de 2010

DEDO DE MOÇA ATACA OUTRA VEZ!


Dedo de Moça era um sujeito... Tá bom, essa não é uma história sobre o Dedo de Moça histórico – se é que realmente existe algum - mas vamos fazer de conta que era. Afinal de contas, um bom cronista popularesco como eu, preza a sua fama de mau e não revela suas Fontanas de Trefzger. Anfãn, como diria a vaidosa Princesa Jasmyne...


Dedo de Moça era um sujeito intenso, espalhado e verborrágico. Sei lá, até o termo escalafobético poderia bem ser usado para o descrever. Era aquele tipo de pessoa que os poetas descrevem como “uma força incontrolável da natureza”. Sua presença transbordava os rios e às vezes transcendia incontrolável o limite da razão... E tome metáforas.


Quando o vi pela primeira vez me pareceu um homem comum, mas desses bem triviais mesmo, como um daqueles motoristas de ônibus de antigamente, que levantavam a barra das calças para se aliviar do calor, expondo o esdrúxulo de suas canelas e as meias furadas. Era forte, no sentido de ostentar orgulhoso uma grande, sólida e redonda barriga. Transpirento e sempre com o umbigo à mostra, como se até este quisesse participar dos acalorados debates em que o pançudo se metia.


Dedo de Moça era tudo, tudinho, menos um “cara comum”.


Nelson Rodrigues dizia enfático: “Todo canalha é magro!” Dedo de Moça era o contrário: boa praça e espaçoso em todos os sentidos, principalmente no qual o são os homens – e nisso incluem-se algumas mulheres – soterradores, imparáveis como as encostas em avalanche durante e após um temporal. Sua presença se impunha como uma banda de música estridente, não tinha como deixar de o notar. Que trivial que nada: ele era sobrenatural!


Gostava de falar em tom de discurso e pontuava suas frases com sonoras gargalhadas. Quando isso acontecia víamos em sua bocarra alegremente escancarada os dentes bem separados uns dos outros, o que para ele não parecia ser o menor fruto de constrangimento, exatamente o inverso das pessoas que sorriem colocando pudicas a mão sobre a boca. Era feliz como os vândalos quando invadiram Roma.


Aprofundando essa questão relativa à porta de sua voz: a saliva espirrava de sua boca para todos os lados, o homem era como um chafariz grandiloquente, um buldogue faminto, ou, como já falei: uma força da natureza.

Várias vezes em conversas com ele tive vontade e até a intenção de abrir um guarda-chuvas pra me proteger, especialmente na hora da risada. Aposto com vocês que se eu o tivesse feito isso não o constrangeria e até causaria naquele gigante um piripaque de tanto rir. Sua baba era tão profusa que, após reuniões de trabalho víamos espantados um grande círculo de saliva delimitando o lugar à frente do qual ele estivera sentado falando compulsivamente.


A pior situação era nos momentos das grandes reuniões públicas do sindicato, quando o microfone era passado de mão em mão entre os inflamados debatedores. Em vários sentidos Dedo de Moça era o terror daqueles eventos. Abandonava o artefato falatório encharcado e os que não atentavam para o fato logo provavam na boca, involuntariamente e com asco, de seu abjeto veneno. Sua úmida retórica virou piada entre os colegas e eu, que não sou mão-boba nem nada, passei a levar um lenço aos tais encontros públicos.


Certa vez, após um de seus inflamados discursos - aquele tom de madeira rachando – o pançudo me passou o microfone gotejando e foi abraçar efusivamente o presidente da mesa, um sujeito austero e comedido, muito pouco afeito a brincadeiras, ainda mais em público. Retirei calmamente o lenço do bolso e estanquei o produto da verborragia apimentada do companheiro do jeito que deu, lamentava não ter álcool para uma assepsia mais conveniente ou até mesmo atear fogo.


Enganchado nas toras do comandado o presidente viu meu ato e minha expressão de nojo e, para minha surpresa, ao invés de censurar meu desrespeito, fazendo sua tradicional expressão austera, caiu foi na risada. Vi a hora em que até ele mesmo ia fazer piada com o assunto ali na frente de todo mundo, talvez na vã tentativa de enquadrar o companheiro babão.


Mas Dedo de Moça não se emendava e seguiu devorando o universo com sua imensa bocarra insaciável. Tempos depois me afastei daquele grupo animado e nunca mais vi esse meu amigo extraordinário. No final do ano passado eu caminhava pelo centro da cidade e ouvi um trovão chamando pelo meu nome como uma intervenção divina: era Dedo de Moça esparramado dentro de um táxi. Felizmente eu não estava ao alcance de sua saliva e nem tampouco deu tempo dele me deslocar uma costela com um de seus famigerados abraços.


Hoje não sinto tanta falta daquela época e de um certo status que aquele trabalho me emprestava, o que guardo com alegria e afeto são as recordações de meus “encontros com esses homens notáveis” (Saravá Gurdjeff!), esses seres de um outro mundo que são tão raros e diferentes desses do lado de cá.


segunda-feira, 22 de março de 2010

JUCA MAGALHÃES APRESENTA IDHÉIA MUSICAL NA UFES

Quero convidar os amigos para minha participação no projeto Informa-Ação e Cultura, uma iniciativa nova do Curso de Biblioteconomia na UFES. Vou falar de Música de Concerto e cultura, a entrada é gratuita. Segue abaixo maiores informações:


Idhéia Musical é uma palestra que aborda em linhas gerais a trajetória da dita “Música de Concerto” ocidental, abordando os períodos da história da música, seus principais compositores desde o barroco até a música clássica no Brasil, culminando com um pouco de sua trajetória também aqui no Estado do Espírito Santo.


São apresentados trechos de ópera, oratório, das orquestras e suas diferentes formações: sinfônica, filarmônica, de câmara etc. Vemos as transições ao longo dos séculos - de instrumentos, de estética musical, de forma - fazendo uso de comparações com outras expressões artísticas como a pintura, a moda, até a arquitetura e a história em geral.


A Idhéia Musical tem aproximadamente uma hora - podendo se estender em função do interesse dos presentes - mas foi pensada para ser ágil, divertida e com muita informação visual que, aliada à musical, desperta a memória afetiva do ouvinte para aquelas melodias que todo mundo conhece sem saber de quem é, o que é ou de quando é. A intenção é fomentar a formação de platéia entre jovens, adultos, idosos e qualquer um que se interesse em obter uma breve panorâmica da música.


No final falo sobre o livro “Da Capo” que narra o período de criação da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo – OFES e a temporada de concertos do grupo, dando dicas de comportamento para evitar as gafes mais comuns nos teatros e também sugerindo os melhores sites da Internet que hoje disponibilizam gratuitamente as mais cobiçadas gravações de música de todos os tempos, socializando uma informação que sempre foi cara e considerada elitista.


Idheia Musical é uma criação de Juca Magalhães. Antigo colaborador da Associação de Amigos da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo, publicou em 2002 – através do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo - o único livro sobre o grupo lançando luz sobre sua fundação. É também professor substituto no Departamento de Biblioteconomia da Universidade Federal do Espírito Santo, Gerente de Comunicação do recém criado Instituto Todos os Cantos e autor do blog A Letra Elektrônica.


Resumo da Ópera:

Palestra Idhéia Musical – Uma introdução à Música de Concerto

Com o professor e escritor Juca Magalhães

Dia: 25 de março de 2010.

Horário: a partir de 19 hs.

Entrada Gratuita com sorteio do livro Da Capo.

Local: Universidade Federal do Espírito Santo – CCJE. EDII – Salão Rosa

Maiores informações: http://www.projetoinformaacaoecultura.blogspot.com/

domingo, 21 de março de 2010

DEDO DE MOÇA E OS CORAÇÕES VAGABUNDOS

Eu demorei a ver o filme Coração Vagabundo com o Caetano Veloso porque muita gente tinha dito que era chato, que Caetano é um cara pedante, que é arrogante e o caralho à quatro. Mais tarde acabei lendo também algumas opiniões positivas com relação ao roteiro, chamando atenção para pequenas historinhas que interligam alguns assuntos de maneira delicada e criativa e pude ver que realmente é assim.


Bom, o filme é do cara, então tem hora que Caetano soa pedante mesmo. Isso fica claro quando o cantor explicita sua posição contrária a qualquer tipo de religião, com a qual eu hoje concordo inteiramente, também acho que John Lennon estava certo: imagine se não houvesse religião. Outro momento é quando ele diz que a música da América é a mais importante do planeta, seguida da Cubana... É o mesmo que dizer que o Brasil não é o país do futebol, soou como assunto para levantar polêmica e nada mais.


Mas teve uma hora do filme que eu achei muito gozada. Chegando no Japão o cantor baiano tomou um severo pente fino na alfândega e reclamou que um cara tinha enfiado a mão em seu pinto, que tinha pegado e apertado. Depois reclamou com aquele sotaque preguiçoso: “poxa, eu nem conheço o cara...” Daí eu pensei: quer dizer então que se fosse um conhecido tava tudo certo? Isso me remeteu a uma outra história...


Trabalhei em uma empresa em que o gerente era um cara arrogante e prepotente daqueles de dar raiva. Sabe aquele sujeito, enquanto indivíduo, que optou por ser calveludo? Pois é, cabelos “on do lados”, ou seja só dos lados mesmo. Pra começar o cara era fumante inveterado e pitava seu cigarrinho fosse onde estivesse. Quando alguém reclamava que o ambiente era de ar-condicionado ele logo falava: “Bem lembrado!” E acendia um cigarro.


Caminhava de cabeça bem erguida e tinha o costume de proferir suas frases como se estivesse desafiando todo mundo pra porrada, era barrigudinho, usava a camisa um pouco aberta para mostrar o peito cabeludo e ostentava um sonoro bigodão, vai guardando... Num domingão de tarde volta essa boa bisca da cachaçada e é parado pela polícia. Os canas nem notaram o grau de doideira do infeliz, o problema maior é que ele não tinha documento do carro. Daí nosso gerente fez exatamente o que não devia, agiu com a polícia como se estivesse falando com seus comandados:


- Como assim apreender meu carro? Vocês estão pensando que estão falando com quem? Quê apreender meu carro o quê gente, me libera logo que eu não posso ficar aqui perdendo tempo não?! – Os policiais se entreolharam sérios e o mais forte falou calmamente.


- Senhor, vamos conversar lá dentro, nos acompanhe por favor... – Entraram numa sala e fecharam a porta, daí pediram pro bigodudo repetir o que dissera do lado de fora. Não deu tempo nem de entender a pergunta e o tabefe estalou em seu rosto, o cigarrinho voou longe. Foi aí que ele começou a chorar.


- Não me bate gente, não me bate! – Voltou pra casa de táxi. Ou foi de buzão? Nem sei. O problema mesmo é que a carteira de motorista e o carro tinham sido apreendidos. Daí que na segunda de ressacão e a pé, Branco – esse era o nome do infeliz – teve que pedir ajuda ao seu comandado com quem menos travara cordialidades: um negão chamado Dedo de Moça, que tinha contatos e amigos influentes dentro da polícia.


Uma semana depois Dedo de Moça veio me confidenciar todo o ocorrido. Uma das primeiras coisas que os policiais contaram divertidos - antes de resolver a parada pro companheiro - é que tinham dado uns tapas pra enquadrar aquele indivíduo alteradinho e muito entranharam do negão se dar ao trabalho de ir lá recuperar a carteira prum sujeito tão arrogante e babaca. Antes fosse só isso, enfim isso não era tudo.


No sábado, depois do expediente, Branco estava se sentindo agradecido por recuperar seu possante, uma Marajó vermelha, e convidou Dedo de Moça pra tomar umas cervejas na Curva da Jurema, pagodinho tradicional, tudo nos conformes. Encheram a lata. Quando foram embora era já final da tarde e o negão se assustou com o gerente o seguindo, dando farol alto, buzinando pra chamar sua atenção. Encostou no Calçadão de Camburi e foi lá perguntar pro maluco o que é que ele tinha esquecido. Daí ouviu o seguinte:


- Não esqueci nada não Dedo de Moça, eu to é querendo te chamar pra gente ir prum motel! – Bom, eu quase cai da cadeira quando ele me contou isso, nem imaginava que nosso gerente fosse gay, daí perguntei.


- E o que foi que você fez?


- Eu? Ué, eu falei pra ele que eu era casado, pra ele me respeitar...


- Porra Dedo de Moça! Isso lá é resposta que se dê? Quer dizer então que se você fosse solteiro você tinha ido pro motel com o cara? – Se levantando e ficando bravo:


- Ah Juca! Eu sei lá que porra foi que eu falei!

O LADO DE FORA OU QUANDO CAI A FICHA

O lado de fora. A luz forte da manhã. O dia começando para um monte de gente, mas não para mim, eu estava deixando o trabalho naquele instante e pensei: cara isso é loucura. Comecei a desejar uma vida normal, dormir cedo, acordar, tomar café e ir pro trabalho.


Henrique Cazes cita Bolão em seu livro, um frasista que disse o seguinte “Na minha vida de músico eu já fiz de tudo, eu só não fiz sucesso”. Daí me ocorreu de parodiar uma velha canção e dizer: “Todo artista tem que ir aonde a grana está”.


Na minha roda de amizades instrumentais sempre imperou um certo metaleirismo, já falei sobre isso, não é música para ouvir, é música para calar e abalar. Não é música de protesto, é um som que gera protesto e talvez esse seja seu aspecto mais divertido.


Resolvemos então montar uma banda com música dos anos cinqüenta e sessenta, o repertório ia de Paul Lanka a The Everly Brothers, mas o grosso focava a fase inicial do Elvis. Não causamos muita espécie e eu achava que a culpa era da sonoridade estridente, mas talvez fosse por eu ser o cantor da banda, afinal, entoar músicas do Rei (falo de Elvis Presley) nunca foi mesmo o meu forte.


O cachê vinha do couvert e aquela noite estava um verdadeiro fracasso, três ou quatro gatos pingados espalhados pelas mesas e a gente lá tocando a toda altura sessenta músicas divididas em três sets de vinte como fosse para uma multidão.


Duas da manhã era geralmente o horário em que o público rareava e o repertório se esgotava, de repente o boteco lotou, parecia até sacanagem. Uma turma de formandos rodara a cidade e o único lugar aberto que encontraram foi o bar em que estávamos.


Fazer o quê? Tínhamos que faturar aquela grana. Resolvemos começar outra vez: mais sessenta canções de fio a pavio. Não preciso nem mencionar que durante a noite vai-se tomando umas e outras, nada de mais, mas dobrando o turno a coisa ia ficar feia.


Com aquela turma de alegres formandos embriagados o bar virou uma zona, logo os outros notívagos que vagavam que nem almas penadas foram parar lá também. Surgiu um primo meu completamente louco, entrou engatinhando no palco, queria cantar ou dedicar uma canção para uma loira meio gorducha que deveria ser o seu fim de noite.


O nome do lugar era Píer Sielemann, ou algo assim, ficava no pé do Barro Vermelho e era escuro que nem breu lá dentro. Os fundos da casa davam para o canal de Camburi, fora em tempos remotos uma casa de “conveniências” e o novo dono manteve a atmosfera obscura.


No final da noite já era dia, mas não teve galo cantando e se tivesse também quem é que ia escutar? Durma-se com um barulho destes. 120 músicas depois eu estava podre, bêbado e pedindo para morrer de mansinho, mas faturamos um gordo cachê, o Beto, dono do bar estava feliz da vida.


Foi só quando saímos daquele inferninho que vimos o céu azul, as nuvens brancas, era dia claro. Bateu aquela sensação de loucura, saca? Não dava pra continuar assim. Foi naquele instante que eu resolvi escalar a outra face da montanha, mas essa é uma história que vai ficar pra depois.


sábado, 20 de março de 2010

A DOCE CRÔNICA DOS PENETRAS COVER

Um dos maiores prazeres de compartilhar textos na Lektra é o retorno das pessoas, a maioria que lê algum texto que gosta não escreve um recado, eu mesmo não o faço muitas vezes pra muita coisa que já li. Então de vez em quando me surpreendo com alguém que leu algum texto e vem me trazer um comentário bacana.


Outro dia mesmo, um colega estava me dizendo que quando leu A Doce Crônica dos Penetras e me disse, literalmente, que tinha voltado aos tempos de criança, lembrado de coisas que nem sabia mais que tinha vivido, daí me contou a seguinte historinha:


O problema da penetra era comum também onde eu morava, mas o pessoal era mais esperto. Eu vi a muvuca formada lá e pensei logo: casamentão! Fui lá todo arrumado pra tomar uma de graça. Na entrada tinha um cara recebendo os convidados e me perguntou desconfiado:


- Você é convidado do noivo ou da noiva? – Muito seguro e confiante, porque nessas horas você não pode dar mole pro azar, disparei.


- Do noivo! – O cara abriu um sorriso bem sacana, enquanto me barrava e respondeu:


- Então rala o peito mané, porque isso aqui é batizado de criança!

quinta-feira, 18 de março de 2010

Superconsumidores no Procon Estadual...

Só pros companheiros que acompanham a Lektra não esquecerem de minha atuação como Mestre de Cerimônias, publico aqui a notícia do lançamento do livro “Novo Procon Estadual – Proteção e Defesa para o Consumidor Capixaba”.


O evento aconteceu ontem (17 de março) no hotel Radisson, durante a realização do II Fórum Estadual dos Direitos do Consumidor com participação de vários palestrantes de peso e toda a equipe do Procon do Espírito Santo comandada pelo competente Antonio Caldas Brito que fez uma revolução naquela autarquia desde que lá foi empossado.


O livro foi idealizado pelo jornalista José Antonio Martinuzzo com participação de uma grande equipe que inclui os assessores de Comunicação do Procon Breno Arêas e Marcela Pedroni. Eu gostei mais ainda quando, folheando pra lá e pra cá achei uma foto em que apareço durante outro evento no ano passado e aqui publico pra vocês em primeira contra-mão.

Depois rolou um coquetel onde encontrei meu amigo Alex Pandini que tomou uma cobradinha básica por conta do texto para a orelha do Livro do Pó até então não realizado. O hômi se arretou, vixe-mainha, e mandou bala tão rápido que hoje de manhã já estava na minha caixa postal. O detalhe é que vocês vão ter que esperar a parada ser publicada para ler essas considerações muito bacanas que Pandini fez – ele mesmo um roqueiro aposentado sobre nossa cultura.


Outro escritor que estava no evento do Procon, aliás, como não poderia deixar de ser, era "O Superconsumidor" Marcos Dessaune. Conversamos um bocado sobre as dificuldades em conviver com certas podridões encroantes, coisas agarradas nas pedras lavadas pelo mar da corrupção local, como mariscos filtrando a sujeira. Sim, essa sujeira é tão velha aqui quanto é o tempo, mas nós somos botocudos velhinho, nós somos mais!


terça-feira, 16 de março de 2010

A DOCE CRÔNICA DOS PENETRAS...


No meu perfil da Letra Elektrônica menciono algumas coisas que foram marcantes na minha infância e adolescência, tipo a prancha de surf Jacaré que era de isopor e vendida em supermercado, uma espécie de avó do bodyboard que enchia a barriga da gente de assaduras todo verão. Outra coisa que falo é das festas de casamento que rolavam num salão anexo à Igreja Santa Rita e que eu e minha turma de desajustados tínhamos costume de entrar sem sermos convidados, os chamados penetras. Ainda sobre aquela rua em que morei, a mesma dessa igreja, me veio uma outra lembrança...


Não que a gente precisasse entrar de penetra em festa pra tomar refrigerante e comer bolo, docinho e salgadinho de graça, a verdadeira diversão era conseguir fazer algo proibido, enganar os trouxas dos adultos. Só pra fornecer uma idéia, o ponto alto da penetra era cumprimentar os noivos, ainda mais praquele bando de guris ainda não iniciados nas artimanhas do sexo que fantasiavam mil e uma sacanagens com as emperequetadas moças casadoiras, elas, prestes a fabricar nenéns, coisa que pra gente era simplesmente um mistério.


Foi no início de uma noite de sábado que chegaram lá em casa o Toninho, Valtinho e seu irmão Marquinhos, todos ouriçados porque a rua estava lotada de carros e a Igreja de gente, casamentão rolando. Tinha uma linha de ônibus que passava naquela rua - alvo constante de ovadas - e nesses dias o motorista passava sufoco pra manobrar em meio aos carros mal estacionados. Meus amigos chegaram de banho tomado e cabelo penteado, muito diferente dos calções e chinelos do dia a dia em que vivíamos escalando o morro do Cruzeiro caçando calangos com tiros de espingardinha Rossi ou cortando pedaços de cactos e jogando pra baixo na esperança infeliz de ver alguém furar o pé.


Coloquei uma roupa “de festa”, desci correndo as escadas que nem um raio - morávamos em uma casa de dois andares o que na época era chamado de sobrado – e ganhei a rua com o resto da turma. Não sei se nessa noite alguém deu bandeira, ou pode ser também que as penetras de tão freqüentes estivessem começando a incomodar, fato é que havia um cara muito do mal encarado na porta pra fazer a filtragem dos “convidados”. Muito ao invés de nos desencorajar, de repente o desafio da penetra ficou mais interessante.


Quando a longa cerimônia de casamento finalmente acabou e as pessoas lentamente começaram a se dirigir pro salão, tentamos chegar na entrada nos misturando aos verdadeiros convivas, fazendo a mais doce expressão de meninos comportados, praticamente cristãos praticantes. O Marquinhos que era hiper cara de pau chegou a pegar na mão de uma senhora e com ela entrou de mãos dadas. Eu não era assim e pra piorar era o maior cagão. Telegrafei a minha tentativa na entrada, só faltei pedir pro porteiro me barrar; meus amigos já estavam todos lá dentro, dei alguma bandeira, aí não deu outra:


O cara botou a mão no meu peito, perguntou com quem eu estava e eu não soube o que dizer, fui tomado de um pânico catatônico, que nem um pateta: dã, dã.... Tomei um passa fora moderado e fiquei lá da entrada com a maior cara de madalena arrependida vendo meus amigos desfilando livremente pelo salão, enchendo a pança de doces e salgadinhos. Valtinho mesmo me acenava com um copo de refrigerante, eles tinham conseguido enganar o temível cão de guarda e eu estava lá fora com cara de otário. Sucesso total! Barba e cabelo no suvaco da perua.


Voltei pra casa abatido, desencantado da vida, tremenda derrota, shame on me! Devia ser umas oito da noite e encontrei minha mãe se arrumando pra sair, como já falei outras vezes ela escrevia uma coluna social muito badalada na cidade e: adivinha onde é que ela estava indo? Volto eu pra festa de casamento confiante como o quê, muito macho do lado da mamãe e para minha decepção o cão de guarda não estava mais na porta barrando ninguém, pelo que parecia sua presença só se fizera necessária na entrada dos convidados e com a escassez dos bicões foi fazer outra coisa.


Logo estava eu enchendo a pança junto com a gangue, rindo, cumprimentando os noivos. Toninho até falou muito sério para o rapaz: cuida bem dela tá? Putz que diversão! Mas não é que lá pelas tantas eu caí das nuvens? O cão de guarda era na verdade o chefe dos garçons e muito puto da vida ficou quando deu com a minha presença estarrante ali no meio do salão. Me pegou pelo braço aborrecido, falava umas coisas do tipo: ô menino eu já não te botei pra fora? Fiquei novamente sem ação enquanto o garçom me arrastava para a saída, a única coisa que eu conseguia balbuciar timidamente era: mãe, mãe!


- Quê mãe o quê menino, deixa de ser besta que eu já te botei pra fora daqui mais cedo, mas como é cara de pau! – Enquanto ele falava isso, soou à nossa frente a voz da mulher maravilha: - João você ficou doido? – O garçom estacou incrédulo, já tinha trabalhado pra mamãe em inúmeros “eventos sociais”, era um dos mais solicitados profissionais da cidade. Quase sem acreditar na resposta que já era óbvia ele ainda perguntou soltando meu braço como se estivesse pegando fogo: – Esse menino é seu filho Dona Maria Nilce? – Mamãe teve uma puta crise de riso, achou engraçadíssima aquela história do garçom querer me tirar da festa. João, coitado, estava roxo de vergonha, eu juro que vi a hora em que ele fez menção de se esconder debaixo da mesa mais próxima.


Desnecessário dizer que depois desta passamos o resto da festa nos empanturrando sob a guarda vigilante e profissional do Seu João e sua equipe. Sabe que outro dia eu o vi na rua? Não está tão velho como eu imaginava, me pareceu muito bem. Minha mãe eu nunca mais pude ver, faleceu tem mais de vinte anos, mas continua sendo minha heroína em histórias singelas como essa. Precisava contrabalancear seu perfil em relação ao da crônica passada, tem muitas horas que gostaria de chamar por seu nome, mas o que ficou mesmo foram essas lembranças e a saudade... Uma puta duma saudade.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Conversa com João Carlos Martins no SESI

João Carlos Martins é uma lenda da música, um dos maiores intérpretes de Bach, muito respeitado em todo o mundo por suas gravações do grande mestre do período barroco. Portanto, não só o concerto será imperdível, mas quero chamar atenção de todos para a conversa com o maestro que vai acontecer às 19 horas e que, sem sombra de dúvida, é uma oportunidade muito bacana de falar sobre música e projetos sociais.

O preço da entrada é outra boa idéia: a doação de um livro infantil. A solista Patrícia Souza é recém formada pela FAMES e deve interpretar algum dos concertos para teclado e orquestra de Bach. No todo a iniciativa é fantástica e o programa é simplesmente imperdível!



domingo, 14 de março de 2010

A CRÔNICA DO MEU PRIMEIRO AMOR

Daí que ontem foi aniversário de Renatinha e a festa foi na casa onde morava um amigo de infância, na rua que morei quando tinha lá pelos meus doze, quatorze anos. Foi naquela rua que vivi muitas aventuras de guri e da qual preservo com carinho algumas de minhas mais caras lembranças pré-adolescentes. Lá na esquina tem um prédio que hoje está velhinho perto de seus vizinhos onde moravam vários amigos como o Geraldo, o Dodas e uma menina loirinha que foi o que mais próximo eu cheguei de um amor juvenil.


Minha mãe era colunista social, como muitos devem saber, então muita gente me pergunta se não sinto falta daquela vida agitada de nosso assim chamado high society capixaba. Que pergunta mais sem propósito! Amava a minha mãe como a maioria das pessoas ama a sua, porém – embora para muitos o que vou dizer seja uma surpresa - esse lado escancarado de colunista dela sempre foi um incômodo para todos nós, razão pela qual dou aqui um exemplo concreto.


Logo correu pela casa a notícia de minha paixonite juvenil, enquanto isso eu sofria com aquele sentimento novo e o acalentava com o receio exagerado de ser mortalmente ferroado, ferido, aprisionado, como as pessoas inexperientes na mata selvagem. Nem às paredes eu confessava que estava amando, morria de vergonha daquele sentimento incontrolável que se apossara de minha barriga como uma revoada de borboletas toda vez que via aquela menina, então eu escondia aquele sentimento dentro de mim e o negava para tudo o mais.


A minha amada devia estar assim também, porque ela me procurava todos os dias, criou-se entre nós uma espécie de ritual: todos as manhãs nós nos víamos e religiosamente caminhávamos pela quadra em que morávamos conversando sabe-se-lá sobre o quê. Os passeios se sucediam e os mexericos foram se intensificando, nosso pequeno caso de amor virou assunto em minha casa e na vizinhança, era diversão para os empregados e pessoas simples que se alvoroçam quando vêem os cachorros no cio.


A notícia de meu caso de amor logo chegou aos ouvidos da matriarca e ela ficou muito orgulhosa: seu filho estava se transformando em um homem! Sabem o que ela fez? Sapecou uma nota no jornal no melhor estilo “meu filho Juca está apaixonado!” Casa de ferreiro, espeto de pau. Obviamente eu não lia a coluna de minha mãe, mas para meu azar muita gente lia. O pai da minha amada, por exemplo. Logo meu segredo mais secreto era uma notícia social espalhada aos quatro ventos, até os peixeiros devem ter embrulhado pescados com a notícia de meu amor para seus clientes.


O mais doloroso de tudo foi que nem para a minha amada eu havia tido a coragem de confessar aquele terno sentimento... Ela o descobriu pelo jornal, da pior forma possível, tomando um senhor esbregue da família. Ora a menina devia ter uns dez anos, qual pai não ficaria puto da vida? Logo, fomos proibidos de nos encontrar e nunca mais tivemos nossos passeios inocentes, nunca mais sonhar em viver aquele amor. Os anos se passaram e eu voltei naquela rua por uma coincidência da vida, num dia de verão, o calor sufocante espremeu lembranças através de meus poros. Nós nos reencontramos depois, anos depois. Mas isso é outra história e ela está no Livro do Pó, breve vocês poderão saber como acaba.


Segue abaixo um “teaser” da capa do Livro do Pó – feita pelo Pedrão Nascimento - que está em sua fase final de edição – na Gráfica A1 - e deve ser lançado em algum lugar do mês que vem, muito provavelmente no Teatcher’s Pub que fica no Suvaco da Perua, pertinho de onde o grupo Pó de Anjo ensaiava e outras coisas rolavam... Enquanto isso tenham uma boa semana e não deixem de coisar e aparecer na televisão, segundo Gore Vidal , isso é o fundamental...


sexta-feira, 12 de março de 2010

GERALDÃO FORÉVIS!

Agora estão descobrindo que a morte do Glauco foi coisa de maluco enfiado em drogas e seita religiosa, certamente uma combinação explosiva. Mas quero reproduzir aqui uma das piadas mais engraçadas do Glauco que li numa tirinha do Geraldão - um cara que nos deu tantas alegrais tem que ser lembrado com humor - era mais ou menos assim:

O menino entra na cozinha e o pai trincadão tá batendo o pó com uma gilete em cima de um prato: Téc, téc, téc!

- Pai? Que cê tá fazendo?

- Nada não meu filho... (snif!) Tô batendo mandiopã com banana...

- Ué pai, mas logo em cima da cocaína?

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Vaya com Dios Glauco, Geraldão Forever!

Morre o criador do Geraldão!


Cartunista Glauco é morto com 4 tiros em Osasco

Plantão | Publicada em 12/03/2010 às 10h47m

Reuters/Brasil Online

SÃO PAULO (Reuters) - O cartunista Glauco Villas Boas, de 52 anos, criador do personagem "Geraldão", foi morto com quatro tiros em sua residência na cidade de Osasco na madrugada de sexta-feira, informou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.

Segundo o advogado de Glauco, Ricardo Handro, o cartunista e seu filho Raoni, de 25 anos, foram mortos por bandidos numa tentativa de assalto na casa da família.

A Secretaria de Segurança informou que quando as viaturas policiais chegaram ao local as vítimas tinham sido socorridas por familiares e encaminhadas para o hospital Albert Sabin, mas morreram a caminho do hospital.

De acordo com uma testemunha ouvida pela polícia, três suspeitos chegaram em um carro cinza à casa da família e efetuaram os disparos, segundo o boletim de ocorrência.

Além de cartunista, Glauco também trabalhou como redator em programas humorísticos na tevê.

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Caramba, eu era fãzão do Glauco. O Geraldão foi um personagem fundamental para o cenário roquenrou dos anos oitenta. Tô chocado e passado com essa notícia. Até onde vai a barbárie dessa sociedade cruel que estamos ajudando a construir?


domingo, 7 de março de 2010

EM UMA PALAVRA SÓ: BOMPRACARÁLIUUUU!


Não costumo gostar muito de refilmagens, acho que foi uma implicância que desenvolvi quando fizeram aquela versão lamentável e imbecil de “A Gaiola das Loucas”, depois dessa sempre que os gringos entram numa de dar a versão Bigmac pro que eles consideram um bom filme “estrangeiro” eu prefiro passar batido. Peguemos, por exemplo, o clássico suspense “O Silêncio do Lago” que em sua versão Hollywoodiana ganhou até um inaceitável final feliz. Tem o caso também de outra comédia francesa chamada “Os Visitantes”, ótimo filme, mas que em sua versão USA ficou uma porcaria. Até com produções do passado deles mesmo eu tenho o pé atrás, caso do filme “Os Produtores” - que por aqui em sua versão original (1967) ganhou o nome de “Primavera Para Hitler” – por amar o original nem quis ver o falso, fico pensando como é que o Mel Brooks deixou...


Daí que quando fiquei sabendo da refilmagem de FAME – um clássico do início dos anos oitenta – fiquei cético e até ofendido em minha memória cinematográfica afetiva. Mas acabei me surpreendendo com essa nova abordagem e estou aqui pra pagar a minha língua. Nova York é um puta centro cultural e as escolas de arte de lá – entre muitas outras, evidentemente - fornecem mão de obra para a Broadway continuar funcionando. É numa dessas escolas que a história se passa enfocando os jovens que – guardadas as devidas proporções – manifestam as dúvidas e vivem os mesmo dilemas daquela rapaziada de trinta anos atrás. A arte é dinâmica como a moda e a cultura de forma geral e a maior qualidade desse novo FAMA é justamente nos apresentar uma boa história sob o viés atual de um determinado fazer artístico. Essa nova versão não é uma cópia do roteiro anterior – como no caso grosseiro de A Gaiola das Loucas - mas uma atualização bem feita e deliciosa.


O dilema das artes e de seus intérpretes não envelhece, indefinidamente ilude inúmeros corações e mentes e constrói todo um pano de fundo para a vida das outras pessoas. Os artistas nos divertem, distraem nos momentos de tédio e solidão, embalam nossos sonhos e amores com suas canções. O que seria do mundo sem os artistas? Por isso alguns se tornam tão amados e perseguidos, criticados e bajulados, por isso tantos perdem o contato com o mundo real e tantos são os que por isso sofrem; o que me leva a abordar o próximo assunto deste texto: vi também dois filmes imperdíveis que têm histórias muito parecidas, sua parte mais importante se passa na mesma época, mas os finais acabam sendo bem diferentes.


Primeiro vi o excelente “Simonal – Ninguém Sabe O Duro Que Eu Dei”, uma verdadeira pedrada na mente! Eu lembro pouca coisa do Simonal, mas vendo o filme descobri que a versão de “País Tropical” que eu sempre gostei era com ele e não a do Jorge Ben. O filme tem depoimentos muito bacanas de caras populares na época - e até hoje - como Pelé e Chico Anysio, só para citar dois. Mostra a meteórica ascensão de um menino pobre que viria a se tornar o mais popular entertainer do país na virada dos anos setenta, depois veio a derrocada da carreira e as inúmeras hipóteses para razões de tantos porquês. É uma história triste, mas contada de forma muito respeitosa e emocional, como penso que deve ser.


Depois vi o Loki que dá conta da trajetória do músico Arnaldo Batista. Uma história parecida com a de Tom Zé, que aparece no filme falando de maneira amalucada sobre ter participado da segunda escola vienense e do rompimento da tonalidade (como assim?). Arnaldo foi do céu ao inferno em poucas lições, o início idílico com Os Mutantes, o casamento com aquela linda adolescente chamada Rita Lee, depois a descoberta do LSD e o início da fase negra que terminaria com internações em manicômios até a trágica tentativa de suicídio na noite de ano novo, que era também aniversário da ex-mulher. As feridas deixadas por aquela relação parecem ser muito mais profundas do que até então havia se falado e do que o próprio filme explicita; só para dar uma idéia, a verdadeira matriarca do Rock Nacional se recusou a dar seu depoimento no filme, mas felizmente cedeu o uso de suas imagens.



Ressurgido das cinzas após um longo período de ostracismo – exatamente como na história de Tom Zé – Arnaldo, mais precisamente Os Mutantes, são garimpados por gringos fuçadores de música “diferente” como o David Byrne e esse resgate trás de volta o peculiar criador para o mundo que ele mesmo decidiu abandonar em tempos passados. É feita em Londres uma exposição sobre a Tropicália com um muito esperado show dos Mutantes, tendo Zélia Duncan no vocal, com um monte de artistas gringos pagando pau pros caras. O ponto alto destas é o aparecimento do músico “sui generis” Devendra Banhart que rasga um monte de seda sobre o show e termina seu depoimento assim: in one word (em uma palavra): bompracaráliuuu!


E eu pensei uma só palavra com meus botões: debuquisondetêibou! Mentira, eu ri foi “pracaráliuuu”. É delicioso ver os gringos tentando falar nossa língua pra variar, mal posso esperar o dia em que o congo será descoberto por David Byrne também e a nação botocuda se tornará mainstream “ao vivo e a cores” para todo o Brasil e quiçá o universo. Já imaginou as crianças lá no Harlem estudando as sutilezas interpretativas de instrumentos complexos como a casaca ou o tambor de pele de marreco e em tudo quanto é telejornal do mundo dando a cotação do café? Eu mal posso esperar...

CORRESPONDÊNCIA ELEKTRÔNICA...


Quero convidar os amigos que se interessam por cultura e aqueles que nem tanto assim também, para conhecer a “Exposição e Feira Literária da Barra do Jucu” que vai somente até a noite de hoje - 7 de março de 2010. A iniciativa é do artista Kleber Galveas e a exposição acontece em seu ateliê na Rua Antenor Carneiro, 66, na Barra do Jucu. Andei trocando umas correspondências com o Kleber que é muito gente boa e até adquiriu um exemplar do meu livro sobre a nossa Filarmônica para fazer parte da exposição, segue então um trecho de correspondência trocada com ele...


Você que é artista Kleber, sabe como é complicada a nossa história. Quando fiz esse livrinho sobre a nossa querida e talentosa orquestra filarmônica - que, por sinal, fez ontem um lindo concerto no Marista - eu havia sido convidado para fazer um projeto de revitalização e organização das partituras do grupo e quando pedi um histórico para colocar na apresentação, descobri que simplesmente não existia nada que pudéssemos utilizar como tal. Coisas de lugar bem em inciozinho de sua organização social, falo de nosso Estado enquanto guardião da nossa memória, a OFES nessa época ia já a mil por hora.


Nas minhas horas vagas então - na época eu trabalhava em dois lugares ao mesmo tempo - resolvi pesquisar e descobrir as razões e os porquês daquele misterioso hiato, aquela verdadeira omissão. Acredite amigo, não foi nada fácil. Esbarrei em algumas ciumeiras bobocas muito antigas, em preciosismo de memórias que não batiam com fatos narrados em jornais, essas coisas comuns à pesquisa histórica. Fiz então esse texto que é bem enxuto e conciso, porém de conteúdo importantíssimo simplesmente porque não tem mais nada sobre o assunto para consulta e amanhã ou depois aquelas informações que eu recolhi já terão ido para o espaço, se é que já não foram.


Depois de publicado pelo respeitado IHGES na última “Dezembrada” que contou com a presença do saudoso historiador Renato Pacheco, o livrinho seguiu sua trajetória de filho independente, sempre criticado - e algumas vezes até menosprezado, pelo seu tamanho diminuto e conciso, porém sempre lembrado e cada vez mais lido. Fico então pensando nos inúmeros calhamaços já publicados sobre aspectos não tão relevantes de nossa história e que estão por aí solenemente relegados a um justo esquecimento, sendo a única razão que existe para serem taxados de obra de peso o seu volume mesmo.


Pra encerrar tenho uma história agridoce pra te contar e que (talvez) vá ficar entre a gente. Quando eu trabalhava com aquele prefeito nosso amigo que você sabe quem é, ele me pediu para te convidar para algum evento naquele tradicional espaço cultural, não sei se você lembra. Então, a sua resposta foi veemente e exaltada, me pedindo para dizer ao prefeito, entre outras coisas, que não ia a coisa nenhuma lá enquanto não fosse tirada "aquela doida" da administração. Bom, não nos conhecíamos realmente naquela época e fiquei pensando se devia retransmitir ou não o seu recado mal criado ao nosso alcaide.


O que você não sabe é que uns dias depois o mesmo veio me cobrar o contato e sua presença. Falei então que tinha lhe telefonado, que você afirmou que não ia de jeito nenhum e que tinha me dito poucas e boas.


- Ah é? Mas o que foi que ele disse? - Tentei desconversar:


- Ele... Falou umas coisas lá, poxa chefe eu fico até sem graça de repetir. - Foi aí que ele insistiu mesmo, talvez pensando que você tivesse falado mal dele:


- Fala rapaz, o que foi que ele disse? Eu tô mandando, pode falar. - Quando não sei o que fazer, geralmente respondo à queima roupa, mais ou menos como quem tira o santo do altar pra jogar na sarjeta:


- Ele falou que a pessoa que cuida da parada lá é uma doida! Que é uma vergonha ela estar à frente desse trabalho e que o acervo está sendo destruído por sua irresponsabilidade! Foi isso, falou que a mulher é uma doida! - Sem demonstrar a menor surpresa o chefe se achegou mais para perto de mim olhando pros lados e falou pegando no meu braço:


- Pior Juca, é que ela é uma doida mesmo!


terça-feira, 2 de março de 2010

ABERTURA DA TEMPORADA 2010

Atenção meu povo, hoje (3 de março) tem abertura da temporada 2010 da tradicional Série de Concertos Sinfônicos "Quarta Clássica" da nossa querida Orquestra Filarmônica do Espírito Santo. Um programinha delicioso até para quem não é muito fã de música de concerto: vai rolar a conhecidíssima obra “As Quatro Estações de Vivaldi”, música largamente utilizada em propagandas como da Divinólia ou algo que o parta. Pra encerrar será apresentado o concerto duplo de Brahms, porque é para dois instrumentos solistas, a saber: violino (Daniel Guedes) e violoncelo (Antonio Del Claro).


A regência é do meu amigo de sobrenome complicado, um verdadeiro terror para os releases de imprensa, Helder Trefzger. Como é que pode um sobrenome com seis consoantes e apenas duas vogais? Só mais um detalhe, como o Theatro (sic) Charlos (sic) Ghomes (hehehe) está passando pela sua enésima reforminha, o concerto vai acontecer no Teatro do Marista em Vila Velha. Só espero que não continue esse dilúvio, porque aquela região alaga como o quê, mas também, é preferível ao calor que estávamos passando.


Lembrando disso, fomos assistir recentemente ao show de Marcelo Mansfield e rachamos o bico, quem não foi perdeu. O cara já começou dizendo que gostava muito de estar em vitória e que nunca havia passado por aqui no verão e UAU! Diz ele que transpirou em lugares que nem sabia que existiam.


Outra piada que me ocorre, agora com relação ao violoncelo, um dos solistas da noite, é que um músico estava tocando contrabaixo em um barzinho e depois do show foi abordado por uma senhora querendo o contratar para tocar no casamento da filha porque tinha adorado o som do violoncelo. O músico agradeceu os elogios, mas corrigiu que o que ele estava tocando era contrabaixo, daí a coroa falou: - Ah é? Então não vou querer contratar mais não...


Nos vemos lá galera!